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terça-feira, abril 23, 2024
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Presidente da FATMA fala sobre licenciamento do Estaleiro na Grande Florianópolis

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Presidente da FATMA fala sobre licenciamento do Estaleiro na Grande Florianópolis

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Presidente da Fatma aponta problemas no projeto do estaleiro da OSX e aguarda correções

Diferente das declarações do empresário Eike Batista, alardeando na mídia sobre a instalação do estaleiro da OSX em Biguaçu, na Grande Florianópolis (SC), o presidente da Fundação de Apoio Tecnológico ao Meio Ambiente (Fatma), o engenheiro agrônomo Murilo Xavier Flores, declara ao PortoGente que o licenciamento ambiental está em estudo, tem problemas e que o empreendimento não tem nem licença prévia e que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) precisa concordar.

PortoGente – Qual a posição da Fatma sobre as audiências públicas e como vocês posicionaram-se na audiência realizada na UDESC?

Murilo Xavier Flores – As audiências públicas são debates de esclarecimento, ainda mais com um projeto como a instalação do estaleiro da OSX, de grande envergadura que trará mudanças no cenário e na paisagem da região. Nas audiências, a Fatma apresenta o processo de licenciamento, que nesse caso requer estudos complexos sobre questões geológicas, biológicas, correntes marítimas, biota, pois o meio ambiente é cheio de cadeias interligadas que necessitam de estudos e simulações matemáticas. Nosso papel é mostrar as exigências que são feitas, os níveis de licenciamento, que passa pela licença prévia (que não autoriza ninguém a se instalar, apenas dá a regra do jogo) e a licença de instalação.

PortoGente – Quais são os critérios e parâmetros que a Fatma apontou para o estudo de impacto ambiental?

Flores – No caso da OSX foram apresentadas as preocupações da Fatma com o licenciamento, inclusive solicitamos a complementação desses estudos, como, por exemplo, o que irão fazer com o bota-fora, o que será feito com a quantidade de terra da dragagem anual que será feita na área para manutenção, quais serão os cuidados com o processo de produção do estaleiro. Para o risco de vazamento de óleo eles fizeram estudo para pequenos e pedimos complemento para o caso de acontecer grandes vazamentos de óleo e as ações emergenciais previstas para evitar uma contaminação da baía norte e prejuízos ambientais importantes.

PortoGente – Que tipo de demanda a Fatma faz ao empreendedor para que contrate o EIA/RIMA?

Flores – O empreendedor olha na resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) e verifica o nível de profundidade do estudo. Esse empreendimento da OSX exige um aprofundamento e para isso contrata consultores e descreve o máximo possível as necessidades. A Fatma verifica o que falta, o que não está claro sobre determinado tipo de impacto e sua respectiva solução pra que aquilo não se transforme num problema ambiental. O objetivo é prever os impactos e já apresentar no estudo uma solução tecnológica para evitar os riscos. O estudo consiste em antecipar os problemas e as soluções. Se não houver solução para o problema apontado pela Fatma a licença não sai. Se a solução for adequada a licença sai.

PortoGente – Quais são os procedimentos para tornar o estudo menos vulnerável já que o próprio empreendedor o contrata e quais as precauções da Fatma para garantir seu papel de instituição pública?

Flores – Não é incomum a apresentação de estudos muitos frágeis, os quais rejeitamos. Há casos que precisam ser refeitos, complementados, outros são bem feitos. Empreendedores com maior aporte de capital fazem estudos mais aprofundados, o empreendimento menor tem menos recursos e contratam estudos mais baratos. No caso da OSX os estudos são melhores, porque o investimento é muito alto. Uma equipe multidisciplinar da Fatma analisa os estudos e no caso de não termos na equipe especialista no tema, enviamos para consultores externos. Nesse caso a Fatma indicou os critérios de análise, como o que fazer com a movimentação de terra para o empreendimento que é muito grande, pois a dragagem para a entrada dos navios dentro do estaleiro movimenta um volume maior do que a beira-mar continental. Não pode jogar na baía norte e açorear o canal e a OSX vai ter que solucionar. Nas áreas de mangue ou restinga a necessidade de supressão nos leva a exigir compensações para a perda. Dou exemplos mais simples para não entrar na circulação marítima.

PortoGente – A circulação marítima e a biodiversidade de animais marinhos serão afetadas no momento que vem um navio da Coreia e joga a água do seu calado, captada no outro lado do mundo, aqui na região?

Flores – Essa é uma preocupação que existe em todos os portos, como, por exemplo, a entrada de espécies exóticas que não existem aqui e de repente vem dentro do navio uma espécie marinha que pode afetar o equilíbrio ecológico da região. Nós queremos saber quais são os cuidados para isso ser evitado, e precisa prever no projeto um controle extremamente rigoroso para que isso não aconteça. Isso é que o EIA tem que prever e se não está previsto a Fatma exige uma complementação. Somente quando tudo está respondido é que se emite a licença prévia.

PortoGente – A licença prévia pode ser revogada se não forem cumpridas as determinações da Fatma?

Flores – Se o empreendedor não cumprir é revogada. Tem que acatar o que está no documento. É a licença mais importante, que dá a regra do jogo, se não cumprir não estará cumprindo a lei ambiental.

PortoGente – Mesmo que tenha feito investimento, como o caso da OSX que já cercou o terreno, identificamos que as pessoas não tem mais acesso ao mar pela trilha que havia na área. Sabemos que a legislação não permite isso.

Flores – Eles podem cercar o terreno desde que não haja supressão de vegetação. Isso é uma outra questão. Quando você analisa um estudo de impacto ambiental você analisa também as questões sociais. Quando você autoriza uma usina hidrelétrica há pessoas que perdem suas terras que ficarão submersas. É comum que a Fatma exija indenizações e benefícios às populações a aos afetados direta e indiretamente. O EIA passa por aspectos sociais, em alguns o dano social é mais significativo que o ambiental.

PortoGente – O saneamento, a qualidade da água e balneabilidade da região não serão prejudicados, especialmente nessa área tão bela e atraente para o turismo?

Flores – Se esse risco existir ao se completarem os estudos, a licença não sai. Ou esse risco não existe e aí a licença sai ou se esse risco existir mesmo com todos os estudos e medidas não há a possibilidade de sair a licença. Esse é um debate técnico de custo, às vezes a tecnologia é tão cara que o empreendedor desiste.

PortoGente – E o impacto no turismo, por exemplo?

Flores – A Fatma tem cuidado para, ao licenciar um empreendimento, não prejudicar outras atividades, como o turismo. Exemplo disso é que tem sido negadas licenças para Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) na região de Santo Amaro onde tem o turismo ecológico, que prejudicará outras atividades, assim como em Abelardo Luz acabaria com as cachoeiras que são a beleza cênica do município. É o caso de Itaipu, que se fosse hoje não teria uma licença ambiental. Teria se não acabasse com Sete Quedas. Voltando para a OSX, o empreendimento tem que ser feito de modo a não ter impacto ameaçador ao maior patrimônio da grande Florianópolis, que é a natureza. Essa natureza implica numa atividade econômica importante que é o turismo. Então isso precisa ser bem feito. Quando a gente pensa em estaleiro não tem idéia que hoje é outra coisa, feito com tecnologias limpas, com alto padrão tecnológico como uma montadora de automóvel. Se a OSX não cumprir todas as necessidades da região e que a lei ambiental e as características desse local exigem, não há licença. Pedimos complementações porque do jeito que estava a licença não podia sair e ainda não tivemos retorno, que a OSX prometeu apresentar no mês de maio.

PortoGente – Quais as diferenças de parâmetros entre a Fatma e o Instituto Chico Mendes (ICMBio)?

Flores – É bom esclarecer que são papéis diferentes. O ICMBio não faz licença, quem faz a nível federal é o Ibama, que trata de determinadas situações que não é esse caso. O papel do ICMBio por lei é de anuência. Sem a anuência do ICMBio (por ter APA Anhatomirim, Reserva do Arvoredo, Estação de Carijós na área de influência do empreendimento) a licença seria ilegal e derrubada na justiça, ela não pode existir. O ICMBio apontou problemas que o projeto tem, apontaram que o estudo está incompleto, que afetará os golfinhos, a reserva do arvoredo e que do jeito que está não dá. A Fatma encaminhou as questões do Instituto para a empresa, a qual cabe apresentar as soluções para os problemas. Se as soluções são aceitáveis resolvem o problema o Instituto dá a anuência e a Fatma inclui na licença a redução do impacto nas reservas.

PortoGente – Então existe uma boa relação entre O ICMBio e a Fatma?

Flores – Não é muito boa. Há sempre pontos de vistas diferentes, sabe como é o mundo dos técnicos. Institucionalmente cada um tem seu papel, não cabe à Fatma se meter nas reservas e não cabe ao ICMBio se meter no licenciamento, são papéis distintos. Agora, a licença não sai sem o ICMBio dizer “agora estamos de acordo”. Se não disserem isso não tem licença. Esse mês a OSX afirmou que vai apresentar todas as respostas sobre as questões dos órgãos ambientais. Vamos novamente analisar, inclusive enviando ao ICMBio. Se estiver conveniente, a licença prévia pode sair com os condicionantes estabelecidos. Inclusive pode haver nova apresentação de questionamentos, de complementações. Por isso processo de licenciamento leva tempo, depende da capacidade do empreendedor investir para solucionar os problemas.

PortoGente – As notícias que vem sendo veiculadas geram uma confusão na opinião pública devido a desinformação e boatos sobre o assunto. Um empreendimento dessa natureza traz o desenvolvimento, mas pode chocar com a sustentabilidade.

Flores – Recebi jornalistas que me perguntaram se a obra vai parar. Mas nem obra tem. As pessoas pensam que licenciamento é coisa fácil e rápida, mas não. Existem licenciamentos simples, mas nesse caso exige um estudo profundo, complexo, de muito debate técnico. Vamos receber as respostas, reanalisar e quando a Fatma e o ICMBio chegarem a um acordo daí pode sair a licença. Ainda tem mais uma etapa de uma audiência pública, obrigada por lei. É necessário que a opinião pública tenha pleno conhecimento do projeto, é uma audiência onde o empreendedor obriga-se a apresentar suas propostas para a população de modo geral. Não há licença prévia sem audiência, porque é muito comum a sociedade levantar questões que foram esquecidas.

PortoGente – Caso seja necessário a Fatma e o governo do estado podem sugerir outra área mais conveniente para a sociedade catarinense dentro dos parâmetros ambientais?

Flores – O licenciamento prevê a solicitação de alternativas locacionais ainda antes de liberar a licença prévia, logo que o empreendedor apresenta o projeto. O empreendimento tem alternativa, só que o caso da OSX eles insistem em manter no local e tentam resolver todos os problemas com recursos financeiros e tecnologia. Eles fizeram essa opção. Se eles vão ter sucesso vamos ver, as próximas semanas é que irão dizer se irão ter sucesso ou não, mas apostam que resolverão todos os possíveis problemas que a sociedade está apontando.

(Por Vera Gasparetto, PortoGente, 18/05/2010)

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