20.5 C
fpolis
sexta-feira, abril 26, 2024
Cinesystem

Sindicato das escolas particulares faz relato e pede prioridade à educação

spot_img

Sindicato das escolas particulares faz relato e pede prioridade à educação

spot_imgspot_img

 

“Os gestores públicos, imagina-se, descobriram que o coronavírus infecta mais vigorosamente as pessoas que aproveitam serviços intelectuais. Ou constataram que o coronavírus prefere ambientes escolares, já que às escolas se impediu também quaisquer atividades extracurriculares, como dança, luta, natação e idiomas.” A frase faz parte do relato à comunidade divulgado hoje pelo Sindicato das Escolas Particulares de Santa Catarina, elaborado pelo advogado Oridio Mendes Junior, da Assessoria Jurídica do SINEPE/SC, entidade que representa 1300 estabelecimentos de ensino no Estado, onde estão matriculados aproximadamente 500 mil alunos e trabalham cerca de 40 mil profissionais.

Segue o texto na íntegra:

“É preciso resgatarmos a liberdade das escolas”

 

Oridio Mendes Junior

 

Assessoria Jurídica 

SINEPE/SC – Sindicato das Escolas Particulares de SC

 

O Ministério Público, ao menos na pessoa do Dr. Murillo José Digiácomo, no vizinho Paraná, já alertava para o disparate da adoção da quarentena das atividades de ensino. Publicou artigo, inclusive, dizendo que os gestores públicos conseguiram a proeza de autorizarem a retomada de atividades não-essenciais antes da liberação do serviço de ensino ofertado pelas escolas. Realmente! As escolas, deduz-se das medidas empregadas pelos gestores públicos, constituiriam centros de aglomeração e seria preciso que as crianças e os adolescentes fossem protegidos – até porque seriam vetores da propagação do contágio às pessoas idosas da família.

Sabe-se que essa linha de raciocínio se contrapõe a estudos e dados científicos coletados ao redor do mundo. Estudos na França, no Reino Unido e na Coréia do Sul revelaram que as crianças, em especial, apresentam susceptibilidade de contágio ao coronavírus minorada quando se compara aos adultos.

Também se constatou esse resultado quanto à capacidade das crianças de propagação da doença. Ordenou-se, então, apoiados na dúvida, o encerramento das portas das escolas. O Judiciário endossou a tomada de decisão dos gestores públicos. Afinal, como se extrai de atos dos juízes em ações que questionavam as medidas, cumpre aos gestores públicos a administração do caos. Além disso, a separação de poderes impediria a "intromissão" do Judiciário no Executivo.

ESCOLAS CONTESTAM

O SINEPE/SC gritou, e a sociedade escutou, que os gestores públicos, à margem de critérios científicos, autorizavam o exercício de atividades não-essenciais e mais aglomeradoras que as desempenhadas pelas instituições de ensino.

Aliás, os supermercados, por exemplo, encontravam-se em atividade. Ainda bem! Entretanto, lá estavam os idosos, bem expostos ao vírus, adquirindo, entre outros, os produtos que seriam aproveitados na refeição das crianças que estavam sob seus cuidados.

A realidade cotidiana, portanto, digamos, "deu a volta" na astúcia dos gestores públicos. Não obstante se visse o equívoco grosseiro dos gestores públicos, e o desespero das escolas que experimentavam o amargo da derrota econômica, autoridade alguma dos outros poderes interviu.

O Ministério Público Catarinense assistiu impassível – e insensível – à quarentena das atividades de ensino e, atiçando a fogueira, exigiu a revisão de preço do serviço porque a conjuntura seria financeiramente benéfica. Sério!

O Judiciário, especialmente o Tribunal Catarinense, atento à questão, evitou o colapso do sistema educacional no Estado. Tem mais, admitiu-se, em abril passado, pela Portaria 258, o exercício das atividades culturais das escolas de dança, de natação, de luta e outros de natureza física. As atividades escolares, de natureza intelectual, assim como os cursos de idiomas, remanesceram sob quarentena. Os gestores públicos, imagina-se, descobriram que o coronavírus infecta mais vigorosamente as pessoas que aproveitam serviços intelectuais. Ou constataram que o coronavírus prefere ambientes escolares, já que às escolas se impediu também quaisquer atividades extracurriculares, como dança, luta, natação e idiomas.

MATRIZ DE RISCO

As atividades de educação cultural para maiores de 14 anos se autorizou apenas na Portaria 352 de maio. E municípios do Estado refutaram a ideia, a exemplo de Florianópolis. O ensino superior, ainda que minimamente, e sob rígidas condicionantes, autorizou-se em junho, na Portaria 447. Já sem tempo, os gestores públicos anunciaram no Decreto 724, de julho, que a quarentena das atividades de ensino cessaria em 7 de setembro.

Importante se registre que na ocasião a matriz de risco de contágio observava os mesmos parâmetros – e o universo de educandos e educadores catarinenses jamais integrou amostragem alguma para definição dos motivos da quarentena da atividade de ensino.

À parte dessa questão, na Portaria 464, em julho, o Estado "terceiriza" aos municípios a tomada de decisão acerca da quarentena de atividades que porventura estejam prejudicando a defesa da saúde. O Ministério Público, acertadamente, enxergou a ilegalidade. Pleiteou, e obteve sucesso, ordem judicial para que o Estado, e não os municípios, implementasse a quarentena de atividades que influenciam no aumento do risco de contágio pelo coronavírus.

A ação civil ajuizada pelo Ministério Público, a rigor, buscando a alteração da política pública sob alegação de inércia, parece tecnicamente inadequada. É que a letargia do Estado no cumprimento de preceitos fundamentais – como o direito à saúde – exige outro tipo de ação processual. Não vem ao caso, agora, esse ponto. O certo é que o Judiciário ordenou ao Estado que elencasse e adotasse, por si, a quarentena e outras medidas que entendesse apropriadas para defesa regionalizada da saúde. Editou-se, em agosto, a Portaria 562, que instituiu os níveis de risco gravíssimo, grave, alto e moderado. Também relacionou as atividades passíveis de quarentena quando um ou outro desses níveis fossem evidenciados. Claro: as atividades de ensino foram apontadas em todos os níveis. Quer dizer: de gravíssimo à moderado, as atividades de ensino foram indicadas à quarentena. Nem o ensino técnico escapou. Foram desautorizadas, em bom português – à exceção da educação de nível superior. Os cursos de idiomas, porque inexpressivos no cálculo da matriz de risco, a Portaria 562 submeteu ao controle dos municípios.

CIENTISTAS REPROVAM

Relembro que inexiste dado científico ou publicação dos gestores públicos acerca da influência da comunidade escolar na elevação dos índices de contágio pelo coronavírus. De qualquer forma, o Judiciário "reprovou" a Portaria 562. Disse o juiz, naquela ação ajuizada pelo Ministério Público, que a terceirização da decisão acerca da adoção das medidas de enfrentamento, como a quarentena, continuava sob a responsabilidade exclusiva dos municípios. Paralelamente a essa discussão de legalidade, editou-se em agosto, a Portaria 612 e se postergou o exercício da atividade de ensino para a sugestiva data de 12.10.20. Se não houvesse o retorno das atividades de ensino pelas crianças, que fosse por milagre! O milagre da eleição.

Os gestores públicos, aproveitando a ordem judicial que impôs a alteração também da Portaria 562, editaram a Portaria 658 e assumiram a responsabilidade pela adoção da quarentena nos municípios. Mais do que isso, admitiram a atividade de ensino técnico mesmo na hipótese de risco gravíssimo.  Foram além, alteraram os elementos da matriz matemática que aponta o nível de risco. Mede-se, nesse momento, dados relativos a circunstâncias diferentes das originárias.

Sem dúvida houve explicação do porquê da alteração. Nada convincente, e sem cientificidade alguma. Enfim, o nível gravíssimo de ontem resultava de dados diferentes do nível gravíssimo de hoje. As razões daquele e desse são incomparáveis. O novo cálculo, de qualquer modo, para variar, relega ao esquecimento a investigação dos efeitos do coronavírus na comunidade escolar. De novo permanecemos à margem da coleta de dados para cálculo do nível de risco. Porém, na Portaria 769, deste outubro, os gestores da administração limitaram o ensino básico às atividades extracurriculares e de reforço pedagógico quando caracterizado o nível grave, e autorizaram o exercício pleno da educação caso o risco equivalha a alto ou moderado. Os cursos de idiomas, esquecidos pelo Estado, dependem de legislação municipal. E seria um contrassenso que se admitisse as crianças nas escolas e se as impedisse de frequência nos cursos de idiomas. O nível de risco, de qualquer forma, viabilizará tanto o exercício da educação escolar quanto o da educação cultural. A medida será semanal. Semanal será, também, a organização das famílias, que terão o suporte da escola condicionado ao nível de risco. As escolas viverão a expectativa do nível de risco da próxima semana e se debaterão para que o novíssimo Comitê Municipal homologue o obrigatório Plano de Contingência que a Comissão Escolar – composta de gestores, alunos, família, professores e outros empregados – elabore. São as imposições delineadas na anterior Portaria 750 de setembro passado. Tudo sem notícia nenhuma de quaisquer evidências científicas do impacto negativo da comunidade escolar no agravamento do nível de risco medido pela matriz matemática aplicada.

ESTRANHEZA

Esse esdrúxulo cenário não passou desapercebido pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Lá, ao menos, o Ministério Público "denunciou" em ação civil a inércia dos gestores públicos na elaboração de plano que garantisse às escolas o exercício de suas atividades, proporcionando às crianças e adolescentes interação social, saúde mental e equilíbrio emocional.  Também conseguiu do Poder Judiciário a ordem para que as escolas exercessem a atividade de ensino, cessando a quarentena. Evidente que o Judiciário, no Rio de Janeiro, impôs às escolas a observância de protocolos de saúde. Confiou-se às escolas, todavia, a elaboração e aplicação das práticas. Ingerência alguma se houve na organização ou na gestão das escolas, menos ainda a subjugação do direito de exercício da atividade de ensino à elaboração de Plano de Contingência pelos consumidores de seus serviços. É preciso resgatarmos a liberdade das escolas. A educação, principalmente das crianças e dos adolescentes, é um direito, e não uma ocasional concessão política.

 

spot_img
spot_img
spot_img
spot_img

Leia mais

spot_img